"O dormir representa uma importante actividade do dia-a-dia da criança. Se não forem adquiridos hábitos de sono adequados, isto terá repercussões no comportamento da criança e poderá levar a uma perturbação da vida familiar.
É frequente os pais aconselharem-se junto do médico acerca do sono dos seus filhos e manifestarem as suas preocupações.
Por outro lado, as histórias clínicas estandardizadas são omissas nesta matéria e os médicos que acompanham crianças estão pouco sensibilizados para interrogar os pais sobre os hábitos de sono dos seus filhos.
Assim, devem ser incluídas na história clínica as seguintes perguntas:
- O seu filho tem cama própria?
- Se sim, dorme nela?
- Se sim, adormece nela?
- Se não, com quem partilha?
- O seu filho tem quarto próprio?
- Se sim, dorme nele?
- Se não tem quarto próprio, com quem partilha?
- O seu filho tem dificuldade em adormecer?
- Se sim, o que faz para que ele adormeça?
- O seu filho acorda muitas vezes de noite?
- Se sim, o que faz quando ele acorda?
- O seu filho tem terrores nocturnos?
- O seu filho tem pesadelos?
- O seu filho tem sonambulismo?
É fundamental que a criança adquira desde cedo autonomia para adormecer, isto é, que seja capaz de adormecer sem a presença ou a interferência do adulto.
Durante a noite a criança passa por 5 a 8 ciclos de sono REM e sono não-REM. Na transição do sono não-REM (mais profundo) para o sono REM (mais leve) e durante o sono REM a criança pode acordar e readormece imediatamente.
Se a criança estiver habituada à presença do adulto para o primeiro adormecer, irá necessitar dessa presença várias vezes ao longo da noite, de cada vez que terá que readormecer.
A partir dos 8-9 meses a criança já tem capacidade para adquirir essa autonomia. Será esta a idade ideal para que se habitue a dormir no seu próprio quarto e na sua própria cama.
Para que adormeça de forma autónoma a criança deve ser deitada na sua cama acordada e não já a dormir.
O quarto de dormir deve ser sossegado, pintado em cores suaves, e, de preferência, deve ser utilizado exclusivamente como quarto de dormir e não como quarto de brincar.
O ritual que antecede o ir para a cama deve ser sempre idêntico, calmo, não precedido de brincadeiras violentas. O ritual pode ser, por exemplo, lavar os dentes, ouvir uma história que não contenha elementos assustadores e, de seguida, apagar a luz.
Na criança muito jovem recomenda-se o uso de um “objecto de transição”, que pode ser um boneco, a chupeta ou uma fralda. Este objecto tem um efeito tranquilizador e deve ser usado exclusivamente para adormecer, para que o bebé possa associá-lo ao dormir.
Muitas crianças acordam durante a noite, choram ou chamam os pais. Nestas circunstâncias, a criança deve ser tranquilizada pelo adulto, que a deve deitar e deve dar-lhe a chupeta ou o objecto com que habitualmente dorme. Ao fim de algum tempo a criança será capaz de fazer tudo isto sozinha e dispensará a interferência do adulto para readormecer.
Algumas crianças sentem-se mais seguras com uma luz acesa ou a porta do quarto entreaberta.
Os maus hábitos de sono são difíceis de corrigir. Assim, o bebé que se habituou a adormecer ao colo ou embalado vai necessitar deste estímulo para o primeiro adormecer e para readormecer todas as vezes que acorda durante a noite. O mesmo acontece quando a criança adormece na cama dos pais ou quando os pais se deitam na cama da criança até esta adormecer. Cria-se uma dependência que irá persistir durante muito tempo."
Rosa Gouveia, in Sociedade de Pediatria do Desenvolvimento
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